DGS não tem mecanismos que permitam concluir qual o número de mortes indirectamente provocadas pela onda de altas temperaturas. Só haverá estatísticas sobre os golpes de calor. Mas não para já.

 

Das 1649 mortes registadas em Portugal entre este sábado e terça-feira, sabe-se quantas se ficaram a dever à onda de calor sentida nesses dias? Não, e dificilmente se saberá. Isto porque a Direcção-Geral da Saúde (DGS) consegue identificar apenas os óbitos directamente relacionados com as altas temperaturas – os chamados golpes de calor –, que são raros. Ora a maioria das mortes relacionadas com o calor acontece de forma indirecta, devido à descompensação de doenças crónicas já existentes, principalmente em pessoas idosas. E dificilmente se consegue relacionar uma coisa com a outra à escala nacional.

 

Dentro de “algumas semanas” a DGS terá terminado a codificação das causas de morte e saber-se-á quantas pessoas morreram directamente por golpe de calor, explica a directora-geral da Saúde, Graça Freitas. Às restantes mortes será atribuída a causa directa: normalmente um agravamento de doenças crónicas em estado avançado. No máximo, “os médicos podem escrever na certidão de óbito, nos antecedentes, que a pessoa estava desidratada”, descreve. Não há, por isso, mecanismos que permitam dizer que determinado número de mortes não teria ocorrido se temperatura fosse menor.

 

Mais de 450 óbitos num só dia. É "normal" dadas as temperaturas extremas

 

Isto é o que se sabe: segundo o registo da plataforma de vigilância electrónica de mortalidade em tempo real (SICO/EVM), consultado às 19h desta quarta-feira, domingo foi o dia com mais mortes registadas no país por todas as causas (491). Na segunda-feira houve 478 óbitos, na terça 328. Perante estes dados provisórios, a DGS estima que tenha havido mais 500 mortes do que o "normal" no total dos três dias de onda de calor. Aquilo que é o “normal” ou esperado corresponde à média da mortalidade diária calculada a partir de Março deste ano.

 

Dado que estes números ainda estão em actualização, Graça Freitas apela à cautela na sua interpretação. Mas volta a sublinhar que estão em linha com a mortalidade registada noutros anos com condições meteorológicas semelhantes.

 

Sete mil episódios de urgência

 

Numa conferência de balanço sobre a onda de calor dos últimos dias, ao final da manhã desta quarta-feira, Graças Freitas notou que houve, desde sábado, um aumento moderado dos contactos com os serviços de saúde. O INEM teve mais cinco mil chamadas do que é habitual, a Linha SNS mais cerca de mil. Aos serviços de urgência chegaram mais sete mil episódios de urgência entre domingo e terça-feira, o que não se reflectiu, no entanto, no aumento dos internamentos.

 

Dadas as consequências do calor na saúde, a directora-geral reforçou a necessidade de todas as pessoas, e em especial crianças, idosos e pessoas doentes, se manterem hidratadas e não estarem expostas a muito calor.

 

Aos doentes, Graça Freitas chamou a atenção para que não abandonem as terapêuticas prescritas. E deixou um pedido aos restantes cidadãos: “É precisa solidariedade. Nós temos que tomar contar daqueles que não conseguem tomar conta deles próprios sozinhos."

 

MARGARIDA DAVID CARDOSO

 

In “Público”